A recente recepção que o Presidente dos Estados Unidos da América concedeu ao Dalai Lama provocou um clamor de inquietação mundial a respeito da relação entre os EUA e a China, um aspecto da reinvenção da governança mundial que interessa a todos os Estados e povos.
Os desenvolvimentos anteriores dessas relações transmitem alguma tranqui- lidade quanto ao crescimento pacífico da China e à sua preferência pelo diálogo, em pé de igualdade com os maiores. Talvez seja útil, para evitar que o clamor dos noticiários produza um alarme excessivo na opinião pública, referir duas perspectivas do acontecimento, sem dúvida importante, que foi a recepção concedida em Washington ao Dalai Lama, que em Portugal, não há muitos anos, foi recebido com respeito e afecto.
Os desenvolvimentos anteriores dessas relações transmitem alguma tranqui- lidade quanto ao crescimento pacífico da China e à sua preferência pelo diálogo, em pé de igualdade com os maiores. Talvez seja útil, para evitar que o clamor dos noticiários produza um alarme excessivo na opinião pública, referir duas perspectivas do acontecimento, sem dúvida importante, que foi a recepção concedida em Washington ao Dalai Lama, que em Portugal, não há muitos anos, foi recebido com respeito e afecto.
Por um lado terá sempre de merecer cuidadosa atenção, em relação a qualquer Estado soberano, o conceito que este assume sobre os limites territoriais e humanos que considera dever legitimamente sustentar, aumentar, ou recuperar, para a sua soberania. Embora cada um dos casos tenha circunstâncias históricas e passado jurídico específicos, as áreas que, no caso da China, escaparam ao seu domínio pela imposição daquilo que nacionalistas e maoistas consideraram os Tratados Desiguais, Hong Kong, Macau, a ilha de Taiwan, e agora o Tibete, que se destacam entre outras situações, fazem parte do conceito chinês da sua soberania.
A capacidade de conseguir pacificamente a recuperação da liberdade soberana sobre as parcelas já adquiridas foi demonstrada pelos factos, mas nenhum facto demonstra que algum dos espaços e povos do vasto território não venha a querer ser excluído do conceito de Estado que orienta o Governo da China, nunca existirá segurança de que a violência não venha a entrar em exercício. Uma questão diferente é a que se traduz no estatuto das populações de qualquer dos territórios, reivindicando apenas identidade, um tema que está inscrito na temática dos direitos humanos, incluindo a liberdade religiosa, a especificidade do património imaterial, a definição das minorias.
É evidenciado pelos factos que esta temática internacional dos direitos humanos na China foi transferida para uma urgência amenizada pelos entendimentos procurados nas várias áreas das balanças de poder, mas isso não significa que tenha sido ou possa ser abandonada, designadamente pelos EUA, activos em relação ao tema no que respeita a vários países, designadamente do próprio continente americano.
As intervenções de Obama na sua caminhada para a Sala Oval, comparadas com a moderação nos encontros com os poderosos, e com a invocação da guerra justa, ao receber o Nobel da Paz, para enquadrar outras atitudes guerreiras a que prometera colocar um breve ponto final, confirmam que na prática governamental a teoria é frequentemente diferente da pregação. Mas não significa necessariamente abandono das convicções, e a espera da melhor oportunidade de regressar aos temas pode ser uma virtude de estadista.
No caso presente, talvez a interpretação mais próxima da verdade seja a de que Obama não abandonou os apoios aos direitos fundamentais, designadamente das minorias. Uma demonstração que tem importância para a paz mundial, sem tocar por isso nas convicções soberanas da China, cuja reacção não distingue claramente os dois pontos de vista, mas que todos esperamos que não fira a linha de pacífico crescimento, não apenas económico, não apenas nas áreas de segurança, mas na área do respeito pelos direitos humanos e pela maneira de ser diferente dentro da mesma unidade política.
O Dalai Lama tem progressivamente tornado claro que não é o poder político que o preocupa, e neste ponto a adesão e apoio dos ocidentais dificilmente deixarão de lhe ser concedidos. A recente atitude da China nas negociações exigidas pela crise mundial anima a esperança de que os afirmados "novo conceito de segurança", "teoria do crescimento pacífico", "desenvolvimento em paz" e "mundo harmonioso" possam incluir e proteger, em paz, a identidade dos tibetanos, que não são o único grupo a ser considerado.
ADRIANO MOREIRA